segunda-feira, 12 de março de 2012

Receita de Alfabetização*



"Pegue uma criança de seis anos e lave-a bem. Enxugue-a com cuidado e envolva-a num uniforme, colocando-a sentadinha numa sala de aula. Nas oito primeiras semanas, alimenta-a com exercícios de prontidão. Na nona semana, ponha uma cartilha nas mãos da criança, mas tome cuidado para que ela não se contamine no contato com os livros, jornais, revistas e outros perigosos materiais impressos. Abra a boca da criança e faça com que ela engula as vogais. Quando as tiver digerido, mande-a mastigar, uma a uma, as palavrinhas da cartilha. Cada palavra deve ser mastigada no mínimo sessenta vezes, como na alimentação macrobiótica. Se houver dificuldade para engolir, separe as palavras em pedacinhos. Mantenha a criança em banho-maria durante quatro meses, fazendo exercícios de cópia. Em seguida, faça com que ela ingira algumas frases inteiras. Mexa com cuidado para não embolar.

Ao fim do oitavo mês, espete a criança com um palito, ou melhor, aplique uma prova de leitura e verifique se ela devolve pelo menos, 70% das palavras e frases engolidas. Se isto acontecer, considere a criança alfabetizada. Enrole-a num bonito papel de presente e despache-a para série seguinte.

Se a criança não devolver o que lhe foi dado para engolir, recomece a receita desde o início, isto é, volte aos exercícios de prontidão. Repita a receita quantas vezes forem necessárias. Ao fim de três anos, embrulhe a criança em papel pardo e coloque um rótulo: aluno renitente".


Alfabetização Sem Receita

Pegue uma criança de seis anos, ou mais, no estado em que estiver, suja ou limpa e coloque-a numa sala de aula, onde existam muitas coisas escritas para olhar e examinar. Serve jornais velhos, revistas, embalagens, propaganda eleitoral, latas de óleo vazias, caixas de sabão, sacolas de supermercado, enfim, tudo o que estiver entulhando os armários da escola e da sua casa. Convide a criança para brincar de ler, adivinhando o que está escrito: você vai descobrir que ela já sabe muitas coisas, muitas hipóteses.

Converse com a criança, troque idéias sobre quem são vocês e as coisas de que gostam e não gostam. Escreva no quadro algumas das coisas que foram ditas e leia para ela. Deixe a criança recortar letras, palavras e frases dos jornais velhos e não esqueça de manda-la limpar o chão depois para não criar problemas na escola. Todos os dias leia em voz alta para a criança, alguma coisa interessante: historinha, poesia, notícia de jornal, anedota, letra de música, adivinhação. Mostre para a criança alguns tipos de elementos escritos que, talvez, ela não conheça: um catálogo de telefone, um dicionário, um telegrama, uma carta, um bilhete, um livro de receitas de cozinha.

Desafie a criança a pensar sobre a escrita e pense, você também. Quando a criança estiver tentando escrever, deixe-a perguntar ou ajudar o colega. Não se apavore se a criança estiver comendo letras: até hoje, não houve caso de indigestão alfabética. Acalme a diretora e a supervisora, se elas ficarem alarmadas.

Invente sua própria cartilha. Use a sua imaginação e sua capacidade de observação para ensinar a ler. Leia e estude você também

*Marlene Carvalho

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